segunda-feira, 16 de maio de 2011

Aprendendo a nadar

Somos três os filhos de minha mãe. Quando atravessávamos o patamar da Igreja de Nossa Senhora da Purificação, no início da manhã, a prole se multiplicava em oito, dez. Sobrinhos e filhos de primas e amigas. Era uma romaria de crianças descendo as ladeiras de Saboeiro em direção ao rio Jaguaribe. Algazarra durante todo o percurso. 

Na ida, planos do nadar até a pedra tal, do mergulho mais demorado. À volta, alegrias das conquistas. Consegui chegar primeiro a loca do peixe, fiquei submerso por mais tempo, nadei com mais elegância, quase não bati os pés. Era um alvoroço de chamar a atenção. Lá vai a Lucinha com a garotada para o rio. Os meninos levando câmaras de ar e as garotas cabaças amarradas em uma corda.

Na infância, eu era a mais atrevida e impulsiva dos filhos de dona Lúcia. Aos oito anos já desafiava a correnteza do Jaguaribe, para desespero de minha mãe. Foi necessário ver a morte de perto para respeitá-lo e aceitar os meus limites. Sofri quase dois afogamentos – na primeira vez fui salva por uma tia-bisavó e na outra por minha irmã Suzana – além de ser arrastada pelas águas. Desta vez, o socorro veio no pé oiticica, estrategicamente localizado na margem direito de um dos braços do meu adversário.

As águas caudalosas fascinavam a criançada e causavam medo nos adultos. Menos em minha mãe, que diariamente nos levava ao poço Remanso para aprendermos a nadar. Do alto de uma grande pedra, na beira do rio, ela montava o seu posto de observação. Não perdia uma criança de vista. A cada 15 minutos, ouvíamos os seus gritos. Suzete, Carlinho, Adailta, Eloá, Marcus, Gotardo, Magda, Liduina ... e por aí vai.

Antes de entrar na água o sinal da cruz e pedidos de proteção ao anjo da guarda. Em seguida, amarra as cabaças na cintura e se joga na água. Era um vai-e-vem de braçadas, mergulhos, risos. Dona Lúcia dizia que toda criança deve aprender a nadar para conhecer Jaguaribe. Como saber o que há na outra margem do rio se não atravessá-lo a nado?

Acho que essa filosofia se deve ao fato de ela não saber nadar e nem mesmo mergulhar. Para alguns, uma mulher maluca. Levar um magote de meninos e meninas para aprender a nadar sem garantir socorro em momentos de aflição. Para nós, exemplo de coragem e fé em Nossa Senhora da Purificação que protege os seus. Não sei quem tinha razão, mas todos nós aprendemos a nadar e com exceção da espevitada e atrevida Suzete nenhuma outra criança se afogou ou foi arrastada pelas correntezas.

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